Mata Hari

A sedutora do serviço secreto

Por Leivison Silva

MATA HARI (89’), Estados Unidos (1931), é um filme dirigido por George Fitzmaurice (1885-1940). Protagonizado pela estrela sueca Greta Garbo e pelo galã mexicano Ramón Novarro (1899-1968), esse é o segundo filme da história do cinema baseado na vida da dançarina holandesa Margaretha Gertruida Zelle (1876-1917), mais conhecida por seu nome artístico, Mata Hari. Acusada de espionagem pelas autoridades francesas, ela foi condenada à morte por fuzilamento, entrando para o imaginário popular como um nome que inspira mistério, intriga e desejo, além de símbolo do empoderamento feminino.

Em 1917, auge da Primeira Guerra Mundial, a França lidava com traidores e espiões. Entre eles, estava a bela e exótica dançarina Mata Hari, uma agente secreta que trabalha em Paris a serviço dos alemães. O chefe do departamento de investigações de contra espionagem, Dubois (C. Henry Gordon), a persegue, sem, no entanto, conseguir uma prova concreta de seu envolvimento com o serviço secreto alemão. Mata Hari já havia seduzido o general russo Serge Shubin (Lionel Barrymore), que lhe passava informações ingenuamente, sem desconfiar que ela fosse uma espiã, apesar dos constantes alertas de Dubois.

Nesse meio tempo, o tenente Alexis Rosanoff (Ramón Novarro) aterrissa em Paris, trazendo despachos importantes da Rússia. Curioso sobre Mata Hari, Rosanoff convence seu superior, o general Shubin, a levá-lo para ver uma apresentação da famosa dançarina. Rosanoff apaixona-se por Mata Hari à primeira vista, mas ela o trata como um objeto descartável. Sabendo da chegada de Rosanoff, Andriani (Lewis Stone), o chefe dos espiões, ordena que Mata Hari descubra o conteúdo dos despachos trazidos da Rússia pelo tenente. Ela então se utiliza de todo o seu poder de sedução para roubar os despachos, e é aqui que temos a grande virada da personagem. Mata Hari não esperava ser cativada pelo amor jovial e devoto de Rosanoff. E esse “deslize” romântico foi a oportunidade pela qual Dubois estava esperando.

Mata Hari é muito mais que um filme de espionagem. Na verdade, a Primeira Guerra Mundial é tão somente usada como um pano de fundo para a ação. O fio condutor da trama é o intrincamento das relações de Mata Hari, uma mulher forte e à frente do seu tempo, com os homens que a cercam e que, de uma forma ou de outra, tentam subjugá-la.

A fotografia usa sabiamente o contraste entre luz e sombra, conferindo ao filme um sofisticado ar de segredo. Outro ponto que chama a atenção é a excelente reconstituição de época. Apesar de retratar um período bastante próximo à produção do filme, quatorze anos apenas, a direção de arte faz um trabalho impecável.

Ramón Novarro faz uma ótima dobradinha com Garbo, emprestando ao seu personagem russo todo o ardor de um autêntico latin lover. A química entre os dois está na medida certa. Destaque também para as atuações dos veteranos Lionel Barrymore e Lewis Stone.

E agora o momento de falarmos da divina Greta Garbo.

Após fazer uma feliz transição do cinema mudo para o cinema sonoro, chegando mesmo a ser duplamente indicada ao Oscar de Melhor Atriz por seus dois primeiros filmes falados, Greta Garbo mais uma vez foi aclamada pela crítica e pelo público por Mata Hari, filme de maior sucesso comercial de sua carreira e o mais rentável da MGM naquele ano de 1931.

A “esfinge sueca” encarna a exótica dançarina com muito estilo, dando-lhe mistério, fragilidade, frieza e humanidade em doses certas. É quase impossível imaginar alguma das outras grandes atrizes da época vivenciando a mítica espiã com tanta propriedade quanto Greta Garbo. As marcantes expressões faciais que ela empresta a Mata Hari e, principalmente, as transições entre elas, nos dão o desenho exato do arco da personagem, com toda a palheta de ambiguidades de sentimentos experimentados pela protagonista. Um simples esgar de lábios ou um arquear de sobrancelha a preenche de malícia e perversidade. Em outro momento, seu olhar lânguido grita o amor que Mata Hari sente por Rosanoff. A cabeça levemente inclinada para trás a deixa vulnerável, uma mulher totalmente embriagada de amor.

Greta Garbo foi extremamente eficaz em acentuar a polaridade de sua personagem. É impressionante ver a mudança de Mata Hari ao longo do filme. Se na primeira metade ela é fria, manipuladora, sarcástica e até cínica, depois de ter seu coração arrebatado por Rosanoff torna-se uma mulher frágil, impulsiva e mesmo bondosa. Chama-nos a atenção a intrigante sensualidade que Greta Garbo faz exalar de sua dançarina, nesta que é uma de suas mais emblemáticas atuações.

Em suma, caros leitores, temos aqui um belo clássico do cinema, imperdível e indispensável na coleção de qualquer cinéfilo, e também para aqueles que desejam conhecer o magnífico trabalho dessa grande atriz que, como poucas, tinha total intimidade com as câmeras, o que resultou numa série de atuações memoráveis que ficariam marcadas, quase que arquetipicamente, como uma inestimável herança para a humanidade.

Clique aqui para conhecer os textos teatrais de Antônio Roberto Gerin.

Autor: Leivison Silva

Ator da Cia de Teatro Assisto Porque Gosto. Cantor lírico formado no Curso Básico de Canto Erudito da Escola de Música de Brasília, com realização de trabalhos no teatro, no cinema e na música. Iniciado na arte da palhaçaria – seu palhaço chama-se Josephyno.

Deixe um comentário