O Inspetor Geral

Por Alex Ribeiro

O Inspetor Geral é uma peça de Nikolai Gógol, escrita em 1836, que teve sua estreia em 19 de abril daquele ano, em São Petersburgo, na sua amada Rússia. No Brasil, a peça teve estreia em 1966. A montagem brasileira, repleta de nomes que entrariam para história do teatro nacional, dentre eles Augusto Boal, como diretor, e Gianfrancesco Guarnieri, como o protagonista Khlestakov, foi um verdadeiro sucesso. Apesar de a peça ter arrebatado o público com uma crítica social e política muito intensa, desde a sua estreia, no século XIX, até os dias de hoje, tal arrebatamento não era o objetivo de Gógol, muito pelo contrário, sua pretensão com o texto teatral era um tanto modesta. O escritor, que era um homem conservador e simpatizante do Czar, queria escrever uma comédia leve, em que mostrava o cotidiano ridículo de uma pequena cidade no interior do imenso território russo. Ali, talvez, a obra se tornara tão viva que surpreendera o próprio autor. A habilidade em descrever a realidade, os tipos e costumes russos daquele tempo, permitiu que Gógol revelasse o que havia de mais humano no seu povo e, consequentemente, não foram poucas as mazelas expostas. Apesar das crises artísticas e existenciais que suas obras lhe causaram, Gógol inaugurou uma nova etapa da literatura russa, que iria inspirar outros grandes autores, como Dostoievski, Tolstói, Tchechov e outros mais, fazendo daquele país um dos mais importantes berços da literatura mundial.

Um pequeno vilarejo russo recebe a informação de que em breve chegará aos seus portões um inspetor geral, que virá fiscalizar todo o serviço público do lugar. O governador do vilarejo, que recebe a carta, junta-se aos outros funcionários importantes para que possam traçar uma estratégia para encobrir suas cotidianas corrupções. Ao mesmo tempo, chega-se à cidade um baixo funcionário da capital, porém, metido a importante, e este se instala num hotel do vilarejo. É Khlestakov, que estando de viagem para sua cidade natal, perdera todo o seu dinheiro no jogo, e por essa razão parara ali, sem recursos para seguir com sua viagem. O desespero toma conta das lideranças locais, que precisam imediatamente verificar quem é o forasteiro recém-chegado. Seria o inspetor?

Khlestakov vai recebendo as visitas mais inesperadas, de todos aqueles homens de grande importância, até então desconhecidos por ele. É quando percebe que está sendo confundido com o Inspetor Geral e resolve se aproveitar da situação. Retira dinheiro de todos eles com facilidade, instala-se no melhor quarto da casa do governador, come do melhor banquete e ainda flerta com a filha e a mulher do homem mais importante do vilarejo. Por fim, segue sua viagem com o bolso cheio do dinheiro das propinas que recebera. Os líderes, já tranquilos com a partida pacífica do falso inspetor, comemoram o desfecho favorável que a história teve. Porém, é quando a reviravolta se dá. Ainda no auge da euforia, recebem duas notícias que soam como catástrofes. Khlestakov não era o inspetor geral e enganara a todos, e, para piorar a situação, o verdadeiro inspetor acabava de chegar e estava convocando uma reunião com todos os líderes locais.

O Inspetor Geral é considerado um clássico da sátira teatral e, além disso, uma obra prima da dramaturgia. Sua capacidade de denúncia, juntamente com o humor refinado, fazem com que a peça ainda hoje seja sucesso e demonstre como se configuram as tramas de corrupção já naquele século XIX, chegando até a contemporaneidade.

Os cidadãos do pequeno vilarejo russo, ou mesmo das pequenas e grandes cidades do nosso vasto Brasil, veem-se inseridos no ambiente da peça, pois é também assim que suas autoridades se comportam, manipulando os cargos que ocupam para benefícios próprios. E, às vezes, quando esses cidadãos veem a chegada de um Inspetor Geral que vai varrer toda sujeira, caçar os marajás, ou mesmo acabar com isso daê, terminam por ser enganados, pois, na verdade, o salvador da pátria normalmente é só mais um deles. Caro leitor, por isso o teatro é tão temido pelos poderosos. Porque ele é o espelho da sociedade.

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Autor: Alex Ribeiro

Ator da Cia de Teatro Assisto Porque Gosto, psicólogo, poeta.

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