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Por Alex Ribeiro

Ubu-Rei é uma peça de Alfred Jarry, que teve sua estreia em 1896, em Paris. É a peça mais famosa desse autor e é considerada um marco, a origem do que viria a ser o teatro surrealista e o teatro do absurdo. Nesse primeiro semestre de 2017, o fantástico Marco Nanini voltou aos palcos no papel do protagonista, Pai Ubu.

A peça se passa durante o curto reinado de Pai Ubu, na Polônia, depois de desferir um golpe contra o rei Venceslau. Após ser instigado pela sua esposa, a Mãe Ubu, a tomar o poder, Pai Ubu decide executar o golpe e convida o Capitão Bordura para auxiliá-lo na tomada do poder.

O que mais chama a atenção é a figura do Pai Ubu, um tirano boçal, que impacta o público pelos seus absurdos. Ele mostra, a cada momento, uma faceta diferente: covarde, avarento, orgulhoso e atrapalhado, de uma maneira bastante cômica, características essas que nos lembra, em certa medida, os bufões e mesmo alguns personagens da Comédia Dell Arte.

O teatro do absurdo, inaugurado por Jarry, se estende ao longos dos anos, chegando, em doses bem reais, ao nosso Brasil de hoje, onde assistimos, pasmos, aos absurdos perpetrados por um governo bem ao estilo do Pai Ubu. Um tirano igualmente boçal que, pela ajuda de um Capitão Bordura, leia-se oposição inescrupulosa, está no poder esfacelando os direitos e conquistas sociais do nosso povo. Está na hora de o absurdo sair da nossa história e permanecer somente onde ele é bem vindo, na arte.

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Jogando com a morte

Por Antônio Roberto Gerin

Seja qual for a área do conhecimento humano, e de sua atuação, incluindo-se aí as religiões e as artes, um tema nos aflige por toda vida: a morte. E às vezes nos confundimos em querer saber se exatamente o que nos aflige é o ato de morrer ou o que acontecerá depois da morte. E aí entra uma temática muito cara a Bergman: a existência de Deus. E essa existência é questionada quando nos deparamos com o silêncio Dele. Silêncio absoluto, que exige de nós uma atitude singular. A crença como fonte da existência divina. Sem a fé, Deus não existirá. A não ser que Ele venha até nós e quebre o seu silêncio. Este é exatamente o diapasão narrativo do premiado filme O SÉTIMO SELO (95’), roteiro e direção de Ingmar Bergman, Suécia (1956). Reagir dolorosamente ao finito é nossa condição humana. Esta é a angústia existencial que percorre todo o filme O Sétimo Selo. E ele nos sugere uma outra angústia, esta bem mais prática. Afinal, o que fazermos com nossas vidas enquanto a morte não chega?

Antonius Block (Max Von Sydow), retornando a seu castelo, no norte da Suécia, após dez anos de batalhas nas Cruzadas, recebe a visita da Morte (Bengt Ekerot), uma imagem tenebrosa, vestida de manto negro e face esbranquiçada. É a morte, sim, em pessoa, que vem buscá-lo. A reação de Antonius é rápida. Diz ele, “meu corpo está pronto, mas eu, não!”. E imediatamente desafia a Morte para um jogo de xadrez, visando, assim, a protelar o seu fim. Se vencer, a Morte não o levará. E é neste jogo com pedras marcadas com a Morte que o protagonista vai se aproximando de seu castelo, passando por aldeias dizimadas pela peste negra. Poucos se salvarão, e Antonius quer, evidente, ser um deles.

O filme pode ser entendido a partir de vários ângulos, do histórico ao psicológico, passando sempre, com toda sua crueza, pela mísera existência humana. Estamos falando de uma Idade Média, século XIV, onde o ser profano é totalmente subjugado ao sagrado. E, paradoxalmente, é do sagrado que o homem tira forças para aguentar a servidão econômica e social a que está impiedosamente submetido. É por este cenário de intolerâncias religiosas, de culpas e horrores, acrescido da peste que assola a Europa e dizimaria um terço da sua população entre 1347 e 1352, que Antonius Block vai transitando, silenciosamente, querendo entender o que está além de qualquer entendimento. Ele quer preparar sua alma através da compreensão de um Deus que ele não consegue ver. Se ele não consegue ver esse Deus, o que o espera depois da morte?

A contrapartida de Antonius é seu escudeiro, Jöns (Gunnar Björnstrand), descrente, zombador de si e dos outros, com um nível de consciência raro para a época, mas que vai também, aos poucos, sendo arrastado para a escuridão. E, como é de se esperar, antes de chegar a seu castelo, Antonius Block recebe da Morte o xeque-mate. É o fim. Para ele, para Jöns, para todos. Não, todos não.

No meio de tantas mazelas, autoflagelos e sofrimentos, brilha, incólume, a arte. E a arte vem representada pelas figuras de um casal de artistas de circo itinerante, Mia (Bibi Andersson) e Jof (Nils Poppe). Eles, e o bebê. Alguns atribuem ao casal com criança a função dramática de simbolizar a sagrada família. Pode ser. O filme permite chegar a este simbolismo. Aliás, o filme é cheio de simbolismos, a começar pelas caveiras cuidadosamente dispostas em algum cantinho do enquadramento de algumas cenas. Mas conhecendo Bergman, pode-se também atribuir ao casal a função de representar a arte confrontada com a religião, arte que pode ser a cura para os males que aprisionam a raça humana à condição de títere do divino. Preocupado em participar de um festival de teatro, alheio ao jogo mortal, o qual, no entanto, Jof pressente, o casal muda o caminho em direção ao sul e, com isto, se vê livre da obrigação de participar da dança da morte. A arte sempre sobreviverá, pois ela não é o homem, ela é apenas sua sublime representação.

Ainda insistindo na discussão da importância decisiva, para Bergman, da arte como alternativa redentora à infortunada existência humana, vamos ressaltar a cena da taberna, em que o ator Jof é acusado injustamente de raptar a mulher do ferreiro. O artista é submetido a humilhações terríveis, diante de uma taberna cheia de beberrões e comilões, e todos, sem exceção, aplaudem, às gargalhadas, o festival de maldades. Esta cena não representa só a Idade Média, ela é o passado, o presente, e será o futuro. Jof é apenas alguém que precisa receber o lixo moral que escancara as nossas vergonhas e, por coincidência, segundo a percepção bergmaniana, a lixeira é a arte, o ponto sensível que nos assombra. Afinal, como dissemos, é ela, a arte, que nos revela a nós mesmos.

E a última cena, a dança da morte, antológica, sem dúvida, uma pintura de Rembrandt, uma pintura exata do nosso destino. É nesta pintura que vemos eternizado o jogo invisível da nossa existência. Em algum momento, já estamos avisados, faremos parte deste último ritual.

Enfim, o filme O Sétimo Selo nos apresenta uma realidade que conhecemos de sobra. Ele não inventa nem especula. Por isso, como seres humanos que somos, viajantes desta terra, temos que nos submeter à nossa condição finita. Deus pode existir ou não. Mas uma coisa é certa. Enquanto estivermos vivos, a morte será nossa companheira inseparável.

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Por Alex Ribeiro

Veja o brilho nos meus olhos
No instante em que uma melodia suave
Acompanha o ritmo do meu coração

É o teu perfume, o teu cheiro
É o gosto da tua boca que me beija
A pele que se arrepia intensa
A beleza do que é único e imperfeito

Ah! Me despe por inteiro
Me convida para ser teu na tua cama
Domina minhas forças
Faz de mim o amante eleito

Dança em meu redor como inúmeras borboletas
Faz à minha volta um céu de entardecer
Minha querida, minha amada, dá-me teu mel
Que pra ti hei de viver.