Um Bonde Chamado Desejo

Por Alex Ribeiro                 

Um Bonde Chamado Desejo é uma peça de Tennesse Williams, escrita em 1944. Ele, que nascera em 1914, aos trinta anos recebia o sucesso de público e crítica pela segunda vez, com a estreia de Um Bonde Chamado Desejo, já que, anteriormente, ele havia conquistado grande sucesso e prestígio com a sua primeira peça, À Margem da Vida. No entanto, é o Bonde que laureia Tennesse com o seu primeiro Pulitzer, e é essa grande obra dramatúrgica que traz, também, a personagem mais famosa e cobiçada do nosso autor, a delicada Blanche Dubois. Um Bonde Chamado Desejo foi um sucesso estrondoso. A peça logo foi traduzida para inúmeros idiomas e ganhou o palco de vários países, inclusive do Brasil, que viria a receber sua primeira montagem em 1950. Na estreia norte-americana, por acaso do destino ou não, a peça contou com a estreia profissional de um outro grande nome das artes cênicas, o ator Marlon Brando, que viveu o também marcante Stanley Kowaski. Dois anos mais tarde, ele viveria de novo o Stanley, mas agora no cinema, ao lado da premiada Vivien Leigh. Um clássico do teatro que se configuraria ali, também, como clássico do cinema.

As realidades trazidas na peça mostram o olhar de um autor que vivenciou intensamente os conflitos da periferia norte-americana, e de quem esteve, também, em um sanatório. Tennessee conheceu muito bem os lados mais obscuros que o ser humano carrega dentro de si, e isso está evidente em Um Bonde Chamado Desejo. Os desejos movimentam as personagens durante a peça e nos fazem perceber como eles, ao se chocarem com as mais diversas repressões, fazem com que os conflitos supurem. Tennessee escancara os conflitos dos personagens, trazendo uma sensação de realidade muito intensa. As contradições, medos, explosões de raiva e histeria mostram como o ser humano é complexo e único. Blanche, com certeza, é uma das personagens femininas mais ricas e difíceis do teatro. Sua sensibilidade contrasta com desejos intensos e proibidos, causando nela uma constante exaustão emocional, o que a faz aproximar-se cada vez mais da loucura. Stanley, cunhado de Blanche, é um tipo oposto à personalidade dela. É rude, machista, agressivo, e age instintivamente em boa parte da peça, chegando a ser cruel com a delicada Blanche.

Blanche chega à casa da irmã Stella depois de ver toda sua vida arruinada. Ela perdera o marido, que se suicidara ao ser flagrado em sua homossexualidade. Ela perdera a propriedade por causa das dívidas acumuladas pelos anos de doenças dos familiares, e perdera também o emprego de professora depois de se envolver com um dos seus jovens alunos. Assim, ela chega, aos frangalhos, à casa da irmã, mas ainda mantendo a pose aristocrática, e um desejo imenso por um amor que lhe tire de seus sofrimentos. Mas o que encontra é uma Stella submissa a um marido extremamente rude. Stanley vai fazer de tudo para expulsar a cunhada, mesmo que para isso tenha que destruí-la.

É claro que as personagens, projetadas dentro do universo literário de Tennesse Williams, são um reflexo do que ele próprio viveu desde a sua infância até o início da vida adulta. O seu teatro está repleto de figuras que lembram seu pai, sua mãe, o irmão, e ele mesmo. Por desnudar sua dor, ele nos coloca diante das nossas dores. Por revelar as mazelas das pobres cidades, das pessoas, dos lugares onde viveu, ele nos mostra as nossas mazelas. E, de certa forma, em Um Bonde Chamado Desejo, podemos enxergar nossos mais frágeis desejos sendo oprimidos por uma violência que às vezes vem dos únicos lugares em que podemos nos refugiar. Seja em casa, em nossa cidade, ou mesmo em nível de país, muitas vezes nos vemos como Blanches que, massacrados pela realidade, ficamos à espera “da gentileza de algum desconhecido”.

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Autor: Alex Ribeiro

Ator da Cia de Teatro Assisto Porque Gosto, psicólogo, poeta.

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