Vidas Secas

Vidas que secam ao sol

Por Leivison Silva

Vidas Secas (100’), Brasil (1963), é um clássico do cinema nacional dirigido por Nelson Pereira dos Santos (1928-2018), um dos mais importantes cineastas brasileiros do século XX. Baseado no aclamado romance homônimo de Graciliano Ramos (1892-1953), Vidas Secas foi indicado à Palma de Ouro, no Festival de Cannes, em 1964.

O filme conta a história de uma família de retirantes composta pelo pai, Fabiano (Átila Iório), a mãe, Sinhá Vitória (Maria Ribeiro), os dois filhos do casal e a cachorra Baleia, que tanto no livro quanto no filme tem mais humanidade que os dois meninos, que nem nome têm. Após uma exaustiva caminhada pelo sertão, a família encontra uma fazenda abandonada, a qual passa a ser sua moradia temporária. Fabiano consegue o emprego de vaqueiro e a família passa a viver melhor. Algum tempo depois, Fabiano é preso injustamente pelo Soldado Amarelo (Orlando Macedo), que representa aqui a figura do Estado opressor. Com o fim da estação chuvosa, a família é obrigada a encarar a estrada novamente.

Vidas Secas retrata, sem eufemismos, a miséria do sertão nordestino, a humildade, a vulnerabilidade sócio-econômica e a religiosidade de seu povo, que luta para tentar sobreviver às intempéries da seca. Um povo esquecido pelo Estado e que, apesar de viver sob o jugo do coronelismo que assola a região, mantém a esperança de ter uma vida melhor. Sinhá Vitória, por exemplo, sonha em ter uma cama com colchão de couro.

Nelson optou pelo uso de planos longos, uma fotografia crua, em preto e branco, que enaltece a violência do sol em contraste com a vegetação da caatinga. E optou também por poucos diálogos, falados com impostação teatral. O Nordeste, além de servir como cenário da ação, é retratado como um microcosmo do Brasil, com todas as suas desigualdades, contradições e incoerências.

Vidas Secas é uma prova da vitalidade do cinema brasileiro, que superou os obstáculos surgidos ao longo dos anos, dentre eles a concorrência desleal com os filmes de Hollywood, e contribuiu para a construção de uma identidade nacional, genuinamente brasileira. Um filme que coloca o dedo em feridas ainda não cicatrizadas, mesmo após terem se passado quase sessenta anos desde seu lançamento. É o mesmo povo, abandonado à própria sorte, ainda à mercê da seca e dos desmandos políticos

Simplesmente indispensável para qualquer amante de cinema, caros leitores.

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Autor: Leivison Silva

Ator da Cia de Teatro Assisto Porque Gosto. Cantor lírico formado no Curso Básico de Canto Erudito da Escola de Música de Brasília, com realização de trabalhos no teatro, no cinema e na música. Iniciado na arte da palhaçaria – seu palhaço chama-se Josephyno.

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