Eu sou Vida, Eu não sou Morte

Por Leivison Silva

Eu sou Vida, Eu não sou Morte é uma comédia em dois atos, escrita em 1866 pelo dramaturgo gaúcho José Joaquim de Campos Leão (1829-1883), mais conhecido pelo codinome de Qorpo-Santo. Considerado por muitos estudiosos como o grande precursor mundial do Teatro do Absurdo, Qorpo-Santo foi um autor incompreendido em sua época. Diagnosticado pelos médicos de Porto Alegre com um transtorno psíquico chamado monomania, Qorpo Santo foi interditado judicialmente e internado várias vezes em hospícios, onde produziu boa parte de sua obra teatral. O dramaturgo, porém, não aceitou passivamente tal diagnóstico, exigindo ser examinado por médicos da Corte. Ao contrário dos colegas gaúchos, a comissão médica que examinou Qorpo Santo no Rio de Janeiro foi unânime em dizer que o dramaturgo gozava de excelente saúde mental, mas o estigma já estava enraizado. Apesar de todos os revezes de sua vida, Qorpo Santo foi um autor altamente produtivo. Para se ter uma ideia, apenas no mês de maio do ano de 1866 ele escreveu nada menos que oito comédias. Eu sou Vida, Eu não sou Morte é uma delas.

O primeiro ato da peça começa com os personagens Lindo e Linda cantando uma canção um tanto quanto desconexa. Qorpo-Santo foi subversivo até na escolha dos nomes de seus personagens, desafiando as regras tácitas da escrita teatral. Após a canção de abertura, Lindo e Linda iniciam uma discussão de relação, com Linda exigindo que Lindo lhe faça declarações de amor ainda mais inspiradas e apaixonadas. Nesse meio tempo, chega um Rapaz, que revela ser o marido abandonado por Linda. No segundo ato, entra em cena a Menina, cujo verdadeiro nome é Manuelinha, filha de Lindo e Linda. O Rapaz, sentindo-se ultrajado, acaba por matar Lindo com uma espada, reavendo sua esposa e assumindo a filha do rival como sua filha.

Eu sou Vida, Eu não sou Morte é uma curiosa obra do nosso teatro, um belo exemplo da inventividade, ousadia e pioneirismo de Qorpo-Santo. Ele, um dos grandes autores do teatro brasileiro, ficou esquecido por quase um século, mas, felizmente, foi redescoberto na década 1960. Temos em Eu sou Vida, Eu não sou Morte uma comédia com final trágico, algo inusitado e subversivo para o tradicional teatro brasileiro da época. Outra inovação de Qorpo-Santo é que, ao contrário da maior parte da dramaturgia nacional produzida no século XIX, que geralmente optava por uma linguagem excessivamente ornamentada, floreada e cheia de rodeios, a escrita do dramaturgo gaúcho era bem mais objetiva, com suas falas ligeiramente nonsense encaixadas em diálogos fluidos e diretos. É por todos esses motivos que Qorpo-Santo tem uma importância capital para a história do nosso teatro, mesmo que sua arrojada obra ainda seja pouco conhecida ou encenada nos palcos brasileiros.

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Autor: Leivison Silva

Ator da Cia de Teatro Assisto Porque Gosto. Cantor lírico formado no Curso Básico de Canto Erudito da Escola de Música de Brasília, com realização de trabalhos no teatro, no cinema e na música. Iniciado na arte da palhaçaria – seu palhaço chama-se Josephyno.

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